Minha alma feminina é tão antiga como o cheiro da terra que a chuva molha perfume milenar essência almiscarada que em muito mais de mil noites arde à espera.
Colada à tua boca a minha desordem. O meu vasto querer. O incompossível se fazendo ordem. Colada à tua boca, mas descomedida Árdua Construtor de ilusões examino-te sôfrega Como se fosses morrer colado à minha boca. Como se fosse nascer E tu fosses o dia magnânimo Eu te sorvo extremada à luz do amanhecer.
tens o poder de trazer ao dia a música do meu corpo. a música dos nossos corpos debruçados um sobre o outro e sobre as horas, a cidade, o vento. tens nas tuas mãos fluidas o poder que mal sabes, de alterar as marés que me atravessam. silvia chueire
Trato de escribir en la oscuridad tu nombre. Trato de escribir que te amo. Trato de decir a oscuras esto. No quiero que nadie se entere, que nadie me mire a las tres de la mañana paseando de un lado a otro de la estancia, loco, lleno de ti, enamorado. Iluminado, ciego, lleno de ti, derramándote. Digo tu nombre con todo el silencio de la noche, lo grita mi corazón amordazado. Repito tu nombre, vuelvo a decirlo, lo digo incansablemente, y estoy seguro que habrá de amanecer. Jaime Sabines
Que dias há que na alma me tem posto Um não sei quê, que nasce não sei onde, Vem não sei como, e dói não sei porquê.
grave tua voz me acaricia e afogada nela minha alma se abandona entoa o canto que cavalga, amazona. eugênia fortes
terça-feira, dezembro 13, 2005
Eu sei quando te amo: é quando com teu corpo eu me confundo, não apenas nesta mistura de massa e forma, mas quando na tua alma eu me introduzo e sinto que meu sangue corre em ti, e tudo que é teu corpo não é que um corpo meu que se alongou de mim. Eu sei quando te amo: é quando eu te apalpo e não te sinto, e sinto que a mim mesmo então me abraço, a mim que amo e sou um duplo, eu mesmo e o corpo teu pulsando em mim. Affonso Romano de Sant'Anna
domingo, dezembro 11, 2005
Gostava de morar na tua pele desintegrar-me em ti e reintegrar-me não este exílio escrito no papel por não poder ser carne em tua carne. Gostava de fazer o que tu queres ser alma em tua alma em um só corpo não o perto e o distante entre dois seres não este haver sempre um e sempre o outro. Um corpo noutro corpo e ao fim nenhum tu és eu e eu sou tu e ambos ninguém seremos sempre dois sendo só um. Por isso esta ferida que faz bem este prazer que dói como outro algum e este estar-se tão dentro e sempre aquém. Manuel Alegre, Sete Sonetos e um Quarto
Lo sabíamos ambos, por eso era superfluo repetirlo -también eso sabíamos-, aunque a veces la noche se encarnizara en darnos las palabras más bellas, por si acaso crecían. Esas veces que faltaba un mal minuto para que hubiese chispas rodando por el suelo, y había que apartar los ojos, y amarrarse los lazos casi sueltos de la triste cordura. Porque también sabíamos que era cosa de locos, desvarío extremado (aunque, sí, delicioso) y que era necesario extirparlo de golpe, o sacarle los ojos, o cortarle las manos, para que no salies a la luz y mostrase su inocencia perfecta, que no iba a entender nadie. Josefa Parra
sexta-feira, dezembro 09, 2005
No amor também as palavras são necessárias. Os gestos talvez não bastem. Nem a chuva lá fora enquanto o amor se inflama. Nem o sussurro nas árvores quando os corpos serenam. Nem a melopeia das águas quando as bocas se esmagam. Nem o fulgor dos olhos quando a paixão se impacienta. Penso no amor e logo invento palavras e logo as palavras se põem ébrias. Penso no amor e logo as palavras se soltam como fogosas aves a que não pergunto o rumo. Penso no amor e logo preciso que as palavras digam que amor é este em que penso e em que grito. Fernando Namora
tenho nas mãos o mar que me ilumina os olhos, a memória do corpo a sulcar a água, da água a navegar-me a pele. o desejo de ti a caminhar por mim ontem como se fosse hoje. silvia chueire
foi um beijo onde não importava a boca só tuas mãos quentes me apertando pelas costas nada estava acontecendo na minha frente e a ansiedade que havia não era pouca teus dedos perguntavam pra minha blusa se meu corpo acolheria um delinqüente descoladas as línguas um instante minha resposta saiu um tanto rouca Martha Medeiros
terça-feira, dezembro 06, 2005
Amália Ruiz encontrou a paixão da sua vida no corpo e na voz de um homem proibido. Durante mais de um ano viu-o chegar febril à beira da sua saia, que saía voando depois de um abraço. Não falavam muito, conheciam-se como se tivessem nascido no mesmo quarto, e um simples roçar dos seus agasalhos causava-lhes estremecimentos e ditas. O resto saía-lhes dos seus corpos felizes com tanta facilidade que, pouco tempo depois de se encontrarem, no quarto dos seus amores soava a Sinfonia Pastoral e cheirava a perfume como se Coco Chanel o tivesse inventado. Aquela glória mantinha as suas vidas suspensas e convertia a sua morte num impossível. Por isso eram belos como um feitiço e promissórios como uma fantasia.
Até que, numa noite de Outubro, o amante da tia Meli chegou ao encontro atrasado e a falar de negócios. Ela deixou-se beijar sem paixão e sentiu o hálito da habituação devastando-lhe a boca. Guardou para si as censuras, mas saiu a correr para casa e nunca mais quis saber daquele amor.
Quando o impossível se quer transformar em rotina, é preciso abandoná-lo – Explicou à irmã, que não era capaz de entender uma atitude tão radical. – não podemos embarcar na história de ambicionar uma coisa proibida, de a possuir às vezes como uma bênção, de a desejar sobretudo por isso, por ser impossível, desesperada, e de um momento para o outro vê-la converter-se no anexo de um escritório. Não posso permiti-lo, não vou permiti-lo. Seja por amor de Deus que algo tem de proibido e por isso é abençoado.
O amor não se mede pela liberdade de se expor nas praças e bares, em empecilho. É claro que isto é bom e, às vezes, sublime. Mas se ama também de outra forma, incerta, e este o mistério:
- ilimitado o amor às vezes se limita, proibido é que o amor às vezes se liberta.
eram teus olhos despudorados subindo pelas minhas pernas
rubro toque intuído
no silêncio úmido de nossas bocas...
Andrea Augusto
quarta-feira, novembro 30, 2005
não me arrependo das horas que perdi a esperar-te quando ainda havia a esperança. a esperança que havia ainda quando, a esperar-te, perdi horas de que não me arrependo. José Luís Peixoto
terça-feira, novembro 29, 2005
Não digo que te amei por ter possuído o teu corpo, mas sim por ter roçado a tua alma. Se pudesse estar apenas perto de ti, a ouvir a tua voz e a demorar o meu olhar sobre o teu, ter-te-ia amado na mesma... Fiquei presa no que está para lá do visível; enredada entre as folhas da tua verdadeira essência. Possidónio Cachapa
Quero que saibas uma coisa. Tu já sabes o que é: Se olho a lua de cristal, o ramo rubro do lento Outono em minha janela, se toco junto ao fogo a implacável cinza ou o enrugado corpo da madeira, tudo me leva a ti, como se tudo o que existe, aromas, luz , metais, fossem pequenos barcos que navegam para estas tuas ilhas que me aguardam. Pois, ora, se pouco a pouco deixas de me amar, de te amar, pouco a pouco, deixarei. Se de repente me esqueces, não me procures, já te esqueci também.
Para chegar a ti tropecei muitas vezes. noites inteiras a pronunciar um nome, e era o teu. Noites inteiras a acariciar um corpo, e era o teu. Anos e anos a arrancar com paciência as penas de uma ave para caminhar sem rumo até uma porta sem saber que tu eras essa porta.
O antigo silêncio que ainda me fala entre as ondas.
Eduardo Chirinos
terça-feira, novembro 22, 2005
Tu és o nó de sangue que me sufoca. Dormes na minha insónia como o aroma entre os tendões da madeira fria. És uma faca cravada na minha vida secreta.
Amei-te com os olhos o espelho doido dos olhos e a sede inextinguível da boca
Amei-te com a pele as pernas e os pés e todos os gritos que trago por debaixo da roupa.
Amei-te com as mãos as mesmas com que te digo adeus.
Rosa L. F.
sábado, novembro 19, 2005
Vou partir Como se fosses tu que me abandonasses
Al Berto
segunda-feira, novembro 14, 2005
Estás partindo de mim e eu pressinto que me partes, e partindo, em ti me vais levando, como eu que fico e em mim vou te criando. Tanto mais tu me despedes e te alongas, tanto mais em mim vou te buscando e me alongando, tanto mais em mim vou te compondo e com a lembrança de teu ser me conformando. Estás partindo de mim e eu pressinto na verdade, há muito que partias, há muito que eu consinto que tu partas como um mito... Affonso Romano de Sant'Anna
domingo, novembro 13, 2005
Qualquer coisa pergunta-me qualquer coisa uma tolice um mistério indecifrável simplesmente para que eu saiba que queres ainda saber para que mesmo sem te responder saibas o que te quero dizer
Com quem dormiste? -Dormi com uma mulher diferente em cada noite. Com quem dormiste? -Dormi sozinho. Dormi sempre sozinho. Porque me mentes? -Sempre pensei que te dizia a verdade. Porque me mentes? -Porque a verdade mente como nenhuma outra e eu amo a verdade. Porque partes? -Porque nada significa já muito para mim. Porque partes? -Näo sei. Nunca soube. Quanto tempo deverei esperar por ti? -Näo esperes por mim. Estou cansado e quero descansar. Estás cansado e queres descansar? -Sim, estou cansado e quero descansar. Paul Strand
sexta-feira, novembro 11, 2005
Transformo-me nas coisas que tocaste, crescem-me seios com que te alimente o coração demente e mal fingido; depois serei a forma que deixaste gravada a lume com sabor a cio na carícia de um gesto fugidio.
À altura de todas as estrelas coloco as mãos para tocar o vento. A lua é um fascínio que deixa atónito o meu corpo, e lhe dá um cheiro de fêmea fecundada; um fogo posto a deixar um luar, pleno, detido nos meus olhos. (...) Um tango exausto sobe-me pelas pernas. Há, na minha boca, uma rua silenciosa, por onde se chega à fragilidade dos lábios.
Pergunta-me se ainda és o meu fogo se acendes ainda o minuto de cinza se despertas a ave magoada que se queda na árvore do meu sangue Pergunta-me se o vento não traz nada se o vento tudo arrasta se na quietude do lago repousaram a fúria e o tropel de mil cavalos Pergunta-me se te voltei a encontrar de todas as vezes que me detive junto das pontes enevoadas e se eras tu quem eu via na infinita dispersão do meu ser se eras tu que reunias pedaços do meu poema reconstruindo a folha rasgada na minha mão descrente Qualquer coisa pergunta-me qualquer coisa uma tolice um mistério indecifrável simplesmente para que eu saiba que queres ainda saber para que mesmo sem te responder saibas o que te quero dizer
Mia Couto
De amor nada mais resta que um Outubro e quanto mais amada mais desisto quanto mais tu me despes mais me cubro e quanto mais me escondo mais me avisto.
E sei que mais te enleio e te deslumbro porque se mais me ofusco mais existo. Por dentro me ilumino, sol oculto, por fora te ajoelho, corpo místico.
Não me acordes. Estou morta na quermesse dos teus beijos. Etérea, a minha espécie nem teus zelos amantes a demovem.
Mas quanto mais em nuvem me desfaço mais de terra e de fogo é o abraço com que na carne queres reter-me jovem.
Natália Correia
não te pergunto de onde chegas?, porque sei para onde vais. hoje é a hora exacta em que até o vento até os pássaros desistem. e a noite a teus pés é um instante e um destino.
não te pergunto onde está o teu rosto, tantas vezes ocluso e pisado sob os ramos, onde está o teu rosto? nem te peço que incendeies o teu nome numa nuvem nocturna, nem te procuro.
és tu que me encontras. ficas no rio que passa, nada de um tempo que não existe, nem correntes, nem pedra, nem musgo. nem silêncio.
José Luís Peixoto
domingo, novembro 06, 2005
Que pode uma criatura senão, entre outras criaturas, amar? amar e esquecer,amar e malamar, amar, desamar, amar? sempre, e até de olhos vidrados, amar? Carlos Drummond de Andrade
um homem jura com seu corpo, sua vida,o amor por uma mulher. prega suas palavras naquele corpo até que se torne campo ,flores , frutos,oceano , sussurros.
um homem jura com suas palavras, e suas palavras são sua fortuna. jura com seus olhos, até que o amor trespasse sua vida e ela seja seu destino desvendado.
" Disse que quanto mais a nossa felicidade depender de nós, mais a teremos garantida; e, todavia, a paixão, que pode proporcionar-nos os maiores prazeres e tornar-nos mais felizes, coloca a nossa felicidade inteiramente sobre a dependência dos outros..." Madame du Chatelêt
e os lábios que me roçam pela boca nesta mansa tontura em nunca tê-los...
Meu amor que quartos na memória não ocupamos nós se não partimos...
Mas porque assim te invento e já te troco as horas vou passando dos teus braços que não sei para o vácuo em que me deixas se demoras nesta mansa certeza que não vens.
Maria Teresa Horta
segunda-feira, outubro 31, 2005
Passeia Sobre mim, amor, e colhe o que me resta: Noturno girassol. Rama secreta.
Sou chama aquela que não precisou da fricção de dois gravetos para arder
Eliana Mora
sexta-feira, outubro 28, 2005
(...) Morro do meu corpo e do teu corpo, de nossa morte, amor, morro, morremos no poço do amor a todas as horas, inconsolável, aos gritos, dentro de mim, quero dizer, te chamo, te chamam os que nascem, os que vêm de trás, de ti, os que a ti chegam. Nos morremos, amor, e nada fazemos senão morrermos mais, hora após hora, e escrevermos e falarmos e morrermos. Jaime Sabines
De ti e desta nuvem; desta nuvem branca como voo de pássaro em manhã de abril; de ti e da íntima chama de um fogo que não consente extinção; de ti e de mim fazer um só acorde, um acorde só; para não te perder.
Eugénio de Andrade, Os sulcos da sede
Há uma mulher de musgo nas minhas pálpebras e outra que se esconde nos olhos e é a mesma há uma mulher de música no meu sorriso há uma mulher de tristeza como o tempo nas águas das minhas mãos Há tantas mulheres no meu corpo e tantas quantas todas são uma só ou nenhuma ou nenhuma e é a mesma que caminha contra o vento em qualquer rua António Ramos Rosa
Vem de longe a tua voz. De tão longe que duvido de mim mesma ao ouvi-la. Será que te ouço ou será a mim mesma que escuto? Serão minhas as palavras que murmuras, serei ainda eu? Ou serão apenas ecos do amor que fui, que foste um dia?