segunda-feira, outubro 31, 2005













Passeia
Sobre mim, amor, e colhe o que me resta:
Noturno girassol. Rama secreta.

Hilda Hilst

domingo, outubro 30, 2005

Sem ti


















Sou chama
aquela
que não precisou da fricção de dois gravetos
para arder

Eliana Mora

sexta-feira, outubro 28, 2005














(...)
Morro do meu corpo e do teu corpo,
de nossa morte, amor, morro, morremos
no poço do amor a todas as horas,
inconsolável, aos gritos,
dentro de mim, quero dizer, te chamo,
te chamam os que nascem, os que vêm
de trás, de ti, os que a ti chegam.
Nos morremos, amor, e nada fazemos
senão morrermos mais, hora após hora,
e escrevermos e falarmos e morrermos.

Jaime Sabines


quarta-feira, outubro 26, 2005

Não é que morra de amor, morro de ti










Morro de ti, amor, de amor de ti,
da urgência da minha pele de ti,
da minha alma de ti e da minha boca
e do insuportável que sou sem ti.

Jaime Sabines

terça-feira, outubro 25, 2005

Sede



















beber-te-ia
depositados os lábios na borda de cristal
em goles lentos
a canção a ressoar no corpo

beber-te-ia
nas pernas desordenadas do tempo
hoje ontem
amanhã

silvia chueire

segunda-feira, outubro 24, 2005

Rilkeana













De ti e desta nuvem; desta nuvem
branca como voo de pássaro
em manhã de abril; de ti
e da íntima chama de um fogo
que não consente extinção;
de ti e de mim fazer um só acorde,
um acorde só; para não te perder.

Eugénio de Andrade, Os sulcos da sede








Há uma mulher de musgo nas minhas pálpebras
e outra que se esconde nos olhos e é a mesma
há uma mulher de música
no meu sorriso
há uma mulher de tristeza como o tempo
nas águas das minhas mãos

Há tantas mulheres no meu corpo
e tantas quantas todas são uma só
ou nenhuma
ou nenhuma
e é a mesma que caminha contra o vento
em qualquer rua

António Ramos Rosa















Que dizer da borboleta
que pousa
de ramo em ramo? Talvez ela
não saiba
que os meus olhos a vêem
voar no vento.
Talvez saiba.
Casimiro de Brito

sexta-feira, outubro 21, 2005

Multidão













Uma folha tomba do plátano, um frémito sacode o imo do cipreste,
És tu que me chamas.
Olhos invisíveis sulcam a sombra, penetram-me como à parede os pregos,
És tu que me fitas.
Mãos invisíveis nos ombros me tocam, para as águas dormentes do lago me

atraem,
És tu que me queres.
De sob as vértebras com pálidos toques ligeiros a loucura sai para

o cérebro,
És tu que me penetras.
Não mais os pés pousam na terra, não mais pesa o corpo nos ares,

transporta-o a vertigem obscura

Ada Negri

quinta-feira, outubro 20, 2005

Esquecimento



















Não sei se é bom ou mau quando somos esquecidos - alcançamos a meia paz. A paz inteira é quando nos esquecemos.

Casimiro de Brito, Da Frágil Sabedoria

quarta-feira, outubro 19, 2005

L'amoureuse



















Ela está de pé nas minhas pálpebras
Com os seus cabelos nos meus entrelaçados,
Ela tem a forma das minhas mãos,
Ela tem a cor dos meus olhos,
E desaparece na minha sombra
Como uma pedra sobre o sol.

Ela tem sempre os olhos abertos
E não me deixa dormir.
Os sonhos dela à luz do dia
Fazem os sóis evaporar-se,
Fazem-me rir, chorar e rir,
Falar sem ter nada para dizer.

Paul Éluard

segunda-feira, outubro 17, 2005

Metade


















"Que a força do medo que eu tenho,
não me impeça de ver o que anseio.
Que a morte de tudo o que acredito
não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito,
mas a outra metade é silêncio...

(...)

E que a minha loucura seja perdoada,
Porque metade de mim é amor,
e a outra metade...
também..."

Oswaldo Montenegro, Metade


sábado, outubro 15, 2005

Vivo













tenho um corpo vivo,
de palavras e contornos,
um murmúrio perdido
no tempo.


um corpo que anseia
o oceano,

a foz.

tenho um corpo que não se cala
ainda que eu silencie.


tenho uma canção no corpo,
devia ser para ti.

silvia chueire

quinta-feira, outubro 13, 2005















...Mas o preço que pago para te ter
é ter-te apenas quando puder ver-te
e ao ver-te saber que vou deixar de ver-te

Ruy Belo

quarta-feira, outubro 12, 2005













O amor também se faz com a alma, almas encostadas uma à outra, com os seus aneis erógenos, a sua aflição, o seu desassossego.

Casimiro de Brito, Da Frágil Sabedoria

segunda-feira, outubro 10, 2005


















Que pena. Éramos uma invenção
Tão boa e amável.
Um aeroplano feito de um homem e de uma mulher.
Com asas e tudo.
Pairávamos ligeiramente por cima da terra.
Até voávamos um pouco.


Yehuda Amichai

domingo, outubro 09, 2005


















Por sorte andas bem longe, lá por fora,
já me esqueci de ti completamente.
É mais fácil assim, saber-te ausente,
corre mais fina a vida junto à morte.
...
Entre os meus dedos fica o lugar oco
onde tão certo deixo esse postal
ilustrado do teu esquecimento.

António Franco Alexandre

sexta-feira, outubro 07, 2005











O amor é uma coisa, a vida é outra. A realidade pode matar, o amor é mais bonito que a vida. A vida que se lixe. Num momento, num olhar, o coração apanha-se para sempre. Ama-se alguém. Por muito longe, por muito difícil, por muito desesperadamente. O coração guarda o que se nos escapa das mãos. E durante o dia e durante a vida, quando não está lá quem se ama, não é ela que nos acompanha - é o nosso amor, o amor que se lhe tem.

Miguel Esteves Cardoso

Encontrado aqui

quarta-feira, outubro 05, 2005

Ontem
















~


Ontem é uma pedra que atiro ao espelho
Nos dias em que sobrevivo
À imposição da tua ausência.

José Rui Teixeira

terça-feira, outubro 04, 2005













Pelas ruas da cidade, vai o meu amor.
Pouco importa, aonde vá no tempo dividido.
Já não é o meu amor: qualquer um lhe pode falar.
Já nem sequer se lembra, quem foi que o amou,
E o ilumina de longe para que não caia!

René Char

sábado, outubro 01, 2005

















Eu eras tu!
Como podemos então não morrer de amor pela parte que nosso ser já viu a nú?
Nesse tempo em que por tanto amar tu e eu fôramos um.

Amélia Vieira