sexta-feira, agosto 31, 2007



Acontece na vida de toda a gente. De repente, a porta que se fechou entreabre-se, a grade que se acabou de descer volta a erguer-se, o não definitivo já não é senão um talvez, o mundo transfigura-se, um sangue novo corre-nos nas veias. É a esperança. Pena suspensa. O veredicto de um juiz, de um médico, de um cônsul fica adiado. Uma voz anuncia-nos que nem tudo está perdido. Trémulos, com lágrimas de gratidão nos olhos, passamos para o aposento seguinte, onde nos pedem para esperarmos, antes de nos lançarem no abismo.

Nina Berberova, Terra de Ninguém

terça-feira, agosto 28, 2007


Joanna Nowakowska

…Como um cego, agora, vagueio na memória
tacteio os frágeis muros onde a sombra derramaste,
esbarrando na tua lembrança, mesmo à beira do que já não existe,
infantil e torpe. Treme nas minhas mãos um punhal.
Para onde foi o amor.
Eis as palavras para uma despedida.

Juan Luís Panero

segunda-feira, agosto 20, 2007

Ainda que mal


Piotr ROSINSKI

Ainda que mal pergunte,
ainda que mal respondas;
ainda que mal te entenda,
ainda que mal repitas;
ainda que mal insista,
ainda que mal desculpes;
ainda que mal me exprima,
ainda que mal me julgues;
ainda que mal me mostre,
ainda que mal me vejas;
ainda que mal te encare,
ainda que mal te furtes;
ainda que mal te siga,
ainda que mal te voltes;
ainda que mal te ame,
ainda que mal o saibas;
ainda que mal te agarre,
ainda que mal te mates;
ainda assim te pergunto
e me queimando em teu seio,
me salvo e me dano:

amor.

Carlos Drummond de Andrade

sexta-feira, agosto 17, 2007

luto tenaz


Carla Salgueiro

é claro que penso em ti todos os dias. todos. penso com raiva, penso
com uma revolta transtornada, e depois, depois penso com uma
tristeza que me invade inteira, qualquer coisa que me derruba, que
me mata, e que esquecendo-me te esquece. até ao dia seguinte, é
claro.


Sarah Adamopoulos

quarta-feira, agosto 08, 2007

se eu soubesse


Eugeny Kozhevnikov

soubesse eu dos dias verdes
em que a música é tão distante
e o mar rebelado.

soubesse eu do que me esperava,
enquanto escrevia palavras,
com a boca a servir de paleta e pincel
nos desenhos perdidos
em ti;

soubesse eu do vendaval que havia de vir,
depois daquelas horas nas quais corremos livres
pela relva na felicidade sem palavras com palavras
de um amor desmedido;

soubesse eu de todas as coisas
que ainda hoje desconheço,
e não fosse um rio a desaguar no oceano
e não tivesse olhos glaucos e crédulos
num corpo que navegava livremente;

soubesse eu que certas coisas tu não sabias
e do vasto porto mar a avistar-se de santa luzia;

teria dado os exatos mesmos passos,
entregues ao vermelho da paixão.

silvia chueire



terça-feira, agosto 07, 2007

Cielo


Ricardo Costa

Una sombra de pájaros se aleja

hacia ese lugar donde me olvidas.


Belén Sánchez

segunda-feira, agosto 06, 2007


Tim Peterson

o amor torna a morte mais difícil
a Primavera sem ti será possível?

tua veia incendeia a madrugada
a sombra que desfere és tu ainda

Teresa Balté, Requiem

quinta-feira, agosto 02, 2007


Lilya Corneli

Para sempre