quinta-feira, abril 14, 2005



Não escutes agora as minhas palavras, não as ouças,
olha o mar, a indolência com que a tarde cai.
Toca nos meus dedos a claridade feliz que entre eles
se furta, o renovar das ondas, impacientes e iguais.
Deixa que o sol te ilumine o coração,
que o seu desdobrado esplendor te cerre os olhos.
Sobre a areia, sente a eterna pegada do cansaço,
o insistente adejar da ternura que une os nossos corpos,
resvalando na pele última do amor.
Tudo o que vezes sem conta te quis dizer,
aquilo que as palavras na sua frágil bainha
não puderam resguardar, proteger, como a criança
o seu recanto de tristeza, está aqui, sob
esta luz, rumoreja rente à brisa.
Quando, numa outra tarde, a tua solidão se reflectir
na espuma, na límpida liberdade que dela emana,
detém-te um instante, contempla o que derradeiro é,
o que outras mãos, num anelo comum, comungaram.
Escuta então, esperançosamente, cada sílaba,
nunca a minha voz se ouvirá mais clara.

Juan Luis Panero, Antes que chegue a noite

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